sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Duas práticas pedagógicas importantes

Para a construção de uma organização biocêntrica, dentre os muitos conceitos que contribuem para um espaço de aprendizagem consonante com a educação biocêntrica, duas práticas pedagógicas, que aliadas aos princípios no tópico abaixo apresentados apresentados, são de essencial importância para o consultor, pelo líder ou pelo facilitador estimulando-as em seu grupos:

- Autonomia

Segundo Freire (1996), ensinar não é transferir nem depositar conhecimento no outro. Ensinar é uma ferramenta importante para a prática educativa e somente atinge seu objetivo quando visa a inserção crítica, social, cultural e política dos ensinandos, de modo a proporcionar-lhes autonomia. Daí sua afirmação de que ensinar não é transferir conhecimento (de quem conhece para quem não sabe). É, antes de tudo, criar possibilidades para a sua produção ou a sua construção.

Para este mesmo autor, é na construção crítica e contextual, com assuntos que tenham sentido na vida do aprendiz, que o ensinante[1]se forma e re-forma ao formar e quem é formado forma-se e forma ao ser formado... quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender(Freire, 1996: 22) e, concluindo, afirma que o ensinado que não foi apreendido não pode realmente ser aprendido pelo aprendiz”, ou seja, o aprendiz deve ter condições de recriar ou refazer seu aprendizado.

Ainda segundo este autor, a comparação, a repetição, a dúvida rebelde, a constatação, a curiosidade não facilmente satisfeitas devem ser sempre estimuladas como energias propulsoras da força criadora. O ensinante deve criar meios para que se estabeleça no ensinando a curiosidade permanente e a reflexão crítica do conhecimento que deve ser estabelecido dentro de uma relação processual entre teoria e prática o exercício da curiosidade a faz mais criticamente curiosa” (Freire, 1996: 83).

Essa prática do ensinar curioso e crítico que almeja o saber apreendido e não apenas aprendido, exige reflexão e adoção de atitudes por parte do educador que servir-lhe-ão de essência para ensinar o ensinando a olhar o mundo à sua volta e que, ao percebê-lo em sua realidade, dele se aproprie. Ensinar exige, antes de tudo, ética para um pensar certo, com a corporeificação das palavras pelo exemplo. (Freire, 1996)

Freire (1996: 35) também enfatiza que ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação. Para este autor, pensar certo é poder arriscar, aceitar o novo sem medo e não recusar o velho apenas por ser velho, mas apenas por ter sido superado: “o velho que preserva sua validade ou que encarna uma tradição ou marca uma presença no tempo continua novo”. É também rejeitar qualquer prática preconceituosa de raça, de classe, de gênero que ofenda a substantividade do ser humano e negue radicalmente a democracia. Portanto, educar, é proporcionar condições que permitam o desenvolvimento da autonomia.

- Afetividade

Para Henri Wallon[2] a construção do eu depende essencialmente do outro e as emoções têm papel preponderante no desenvolvimento da pessoa, pois é por meio delas que a pessoa exterioriza seus desejos e vontades. (Santos, 2003)

Heloysa Dantas, citada por Santos (2003: 31) assim fala sobre emoção: “a emoção é altamente orgânica, altera a respiração, os batimentos cardíacos e até o tônus muscular, tem momentos de tensão e distensão que ajudam o ser humano a se conhecer”.

Izabel Galvão complementa: “a emoção causa impacto no outro e tende a se propagar no meio social” (apud Santos, 2003: 31).

O educador biocêntrico expressa sua afetividade aos educandos de maneira incondicional, fomentando-a em cada um do grupo, de modo a obter abertura para um maior desempenho na prática educativa. É possível ensinar e aprender com alegria como FREIRE nos alerta: "o espaço pedagógico é um contexto de aprendizagem democrática” (1996: 97).

Colocar alegria no espaço pedagógico não significa descuidar da rigorosidade metódica. A curiosidade rigorosa deve ser sempre estimulada com o entendimento de que “uma das condições necessárias a pensar certo é não estarmos demasiados certos de nossas certezas” (Freire, 1996: 27).

O amor ou a afetividade podem caminhar juntos com a formação científica, como afirma Freire: "a prática educativa é tudo isso: afetividade, alegria, capacidade científica, domínio técnico a serviço de mudança” (1996: 143).

A vivência da afetividade atua biologicamente no ser e resulta das protovivências adquiridas enquanto bebê e, daí em diante, das vivências da pessoa, aliadas à integração córtico-diencefálica, sendo canalizada para: o amor incondicional, a compaixão, a ternura, a solidariedade, a amizade e para o altruísmo, como se observa no Quadro 3 - Esquema da Afetividade, apresentado ao final deste Blog.

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[1] Conceito utilizado por Paulo Freire para a concepção do professor enquanto agente de facilitação do processo de construção do saber contextual e crítico pelo ensinando (Freire, 1996)

[2] Paris, França (1879 – 1962). Graduou-se em Medicina, Psicologia e Filosofia. Dedicou-se a conhecer a infância e os caminhos da inteligência nas crianças. Contribuiu para importantes reformas do sistema educacional na França. (Santos, 2003)

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Fonte: SAMPAIO, Irene Nousiainen. Organização Biocêntrica - emergência de um novo paradigma na administração. Fortaleza, 2005. 116 p. Monografia (Especialização em Educação Biocêntrica - A Pedagogia do Encontro) – Universidade Estadual do Ceará.

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