O modelo proposto pela Educação Biocêntrica supera a visão reducionista de equipe enquanto conjunto de pessoas que se mantém individualizadas apesar de estarem em grupo. Grupo na visão da Educação Biocêntrica, a partir da teoria do sistema Biodança, é um conjunto intra e inter-relacional de pessoas que privilegiam a vida, as quais estão em constante relação e construção, seja em que dimensão humana se realize, na busca de seu desenvolvimento pelo crescimento de seus integrantes.
Sendo a educação, a organização e meio de transmissão da cultura, a Educação Biocêntrica, enquanto "pedagogia do encontro", pautada no princípio biocêntrico, possibilita os meios para que organizações saudáveis possam surgir, uma vez que proporciona e incentiva a construção por seus integrantes, de uma visão de mundo e cultura integrativa de valorização da vida, respeitando-se na unidade a diversidade.
Mariotti (2000) esclarece alguns conceitos essenciais e faz observação sobre alguns parâmetros importantes para que se possa chegar a consensos que levem em conta o respeito à diversidade de pontos de vista:
- O que se chama de racional é o resultado das percepções da pessoa. Inicialmente surgem como emoções e sentimentos. Em seguida, transformam-se em pensamentos que geram discursos, para, finalmente, serem formalizados como conceitos.
- O racional vem do emocional, não o contrário. Portanto, é necessário que se aprenda a harmonizar razão e emoção. Essa é a proposta essencial do modelo complexo. Nenhum argumento racional pode convencer as pessoas que já não estejam desde o início convencidas ou propensas a isso.
- Os argumentos racionais são úteis para iniciar conversações que não devem insistir em permanecer lineares e/ou excludentes, como os únicos "verdadeiros", sem respeitar a diversidade, e, portanto, contrários à cidadania.
- Uma cultura é uma rede de conversações que define um modo de viver, sendo definida pelos discursos que nela predominam surgidos nas conversações, que começam entre indivíduos, estendem-se às comunidades e por fim a todo o âmbito cultural.
- Os consensos sociais resultam desses discursos, que por sua vez são oriundos das redes de conversação.
- Cresce-se numa cultura vivendo nela como um indivíduo participante da rede de conversações que a define, adquirindo-se e desenvolvendo-se a cidadania que é a base para o desenvolvimento sustentado pautado pelo respeito à vida em todas as suas formas.
- Uma cultura que não desenvolve a cidadania de seus membros permanece subdesenvolvida.
- No caso dos adolescentes e adultos de hoje, é possível alcançar mudanças substanciais na hegemonia do pensamento unidimensional cristalizado em nossa cultura, desde que eles sejam educacional e culturalmente sensibilizados.
A Educação Biocêntrica propicia, portanto, a superação desse unidimensionalizado homo faber pelo resgate do homo ludens para o qual a cooperação lúdica[1] é o mote para a integração. O jogo é anterior à cultura, pois transcende as necessidades imediatas da vida. O divertimento do jogo transcende a toda análise e interpretação lógicas. A educação que se utiliza do lúdico passa a ser libertadora, dialógica e participativa.
O ambiente organizacional torna-se saudável face a uma cultura compartilhada por todos que privilegia a integração saudável da pessoa consigo mesma, com o outro, com os outros, com a organização como um todo, com tudo que existe.
A partir do paradigma complexo, uma organização biocêntrica deve ser considerada como estrutura dissipativa que busca a todo instante a interação neguentrópica[2], processos integrativos de identidade, liderança situacional, processos autopoiéticos.
Segundo o conceito de autopoiese que define os seres vivos como unidades autônomas (organizações) que operam de forma circular fechada, embora se utilize da capacidade de permeabilidade, em correlações internas que produzem a própria rede de relações de componentes que os gera (Capra, 2003), as organizações podem ser assim compreendidas:
Entende-se por organização as relações que devem se dar entre os componentes de um sistema para que este seja reconhecido como membro de uma classe específica. Entende-se por estrutura os componentes e as relações que concretamente constituem uma determinada unidade e realizam sua organização (Maturana apud Cavalcante, 2001: 97).
Portanto, como nos esclarece ainda Cavalcante (2001), a estrutura de uma organização pode ser modificada a cada interação que se estabelece com o meio. Pessoas autoconscientes e apropriadas de si mesmas, aprendem a aprender: "é o fenômeno do conhecer gerando a explicação do conhecer [...] esse fenômeno biológico retrata a nossa autonomia enquanto organismo vivo na construção do mundo” (Cavalcante, 2001: 99).
É sabido, como já vimos anteriormente, que nós, seres humanos, do nascimento até à morte, somos seres sociais, relacionais, inseridos em diversos e diferentes grupos ao longo de nossas vidas, grupos esses formados por diferentes pessoas, as quais modificamos, e somos por elas modificados dialogicamente, devendo-se considerar ainda a interrelação estabelecida pelo movimento das pessoas entre os diferentes grupamentos, conferindo uma identidade própria, mutável, a cada um desses coletivos e à própria humanidade como um todo.
As organizações têm vida própria, a partir de valores próprios, os quais dão essência à cultura organizacional de formas tão distintas e que lhes dão característica.
A afirmação “a vida é uma escola” é aqui compreendida tendo por princípio o pensamento complexo, porque em cada grupamento no qual nos inserimos, aprendemos ou ensinamos algo, modificando a realidade.
Quanto mais for fomentada a criatividade e a inovação cheias de significado nos grupos para que existam na faixa intermediária entre o caos e a ordem, entre o total controle e a total desordem, entre sistemas fechados e sistemas abertos, esses grupos terão mais possibilidades de não somente adaptarem-se a novas realidades, mas de renovarem-se, ressignificarem-se, recriarem-se em um eterno vir-a-ser de possibilidades.
Toda organização deve ser considerada como uma cultura que tem identidade própria. A direção de expressão da legítima cultura se dá de dentro para fora, nunca o inverso, nunca imposta.
Então, é essencial que a linguagem utilizada pelo educador/consultor/ facilitador biocêntrico seja a mesma do ambiente organizacional com referência a questões relacionais, sociais, culturais, religiosas, políticas, etc.
As relações estabelecidas em uma organização na perspectiva biocêntrica implicam uma relação de aprendizado e têm princípio no diálogo (círculo de cultura) e na vivência (ninguém é totalmente sábio sempre, nem totalmente ignorante).
Falar das organizações dentro da ótica da Educação Biocêntrica envolve uma complexa e intrincada rede de relações; ela é a diversidade reunida em uma única teia, cujo espaço deve respeitar as diferenças e incentivar a comunicação, com a compreensão de que o ser humano é ao mesmo tempo imperfeito na sua configuração atual e perfeito nas possibilidades.
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[1] Refere-se à alegria presente em todos os instantes da vidas; gostar de fazer as coisas.
[2] Segundo Góis, citado por Andrade, a interação neguentrópica "produz diversidade, contraste, excitação, instabilidade, incerteza, bifurcação, realimentação, criatividade, auto-organização e transcendência. [...] o facilitador tem o papel de induzir um clima de aprendizado baseado nesses aspectos da interação neguentrópica, mediante o Círculo de Cultura (diálogo e vivência) e a ação compartilhada e solidária" (2003: 18)
[1] Refere-se à alegria presente em todos os instantes da vidas; gostar de fazer as coisas.
[2] Segundo Góis, citado por Andrade, a interação neguentrópica "produz diversidade, contraste, excitação, instabilidade, incerteza, bifurcação, realimentação, criatividade, auto-organização e transcendência. [...] o facilitador tem o papel de induzir um clima de aprendizado baseado nesses aspectos da interação neguentrópica, mediante o Círculo de Cultura (diálogo e vivência) e a ação compartilhada e solidária" (2003: 18)
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Fonte: SAMPAIO, Irene Nousiainen. Organização Biocêntrica - emergência de um novo paradigma na administração. Fortaleza, 2005. 116 p. Monografia (Especialização em Educação Biocêntrica - A Pedagogia do Encontro) – Universidade Estadual do Ceará.
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