Os princípios da Educação Biocêntrica, a seguir explicitados, são de essencial importância para que se estabeleça uma coesão circular saudável na organização biocêntrica.
Ressalto aqui a separação apenas didática entre a organização e a vida das pessoas fora dela (dimensões relacionais integradas: biológica, física, familiar, social, cultural e religiosa), pois dentro do conceito complexo de redes integradas, como já tratado anteriormente, suas vidas estão relacionadas entre si e com a vida organizacional como um todo, dentro e fora dela e, portanto, uma modifica a outra (vide quadro 4 - Cuidados saudáveis com os vínculo.
O educador biocêntrico deverá tê-los apreendido conceitualmente para que possa mediar o ensino-aprendizagem pautado, de fato, no diálogo vivencial e pleno que liberta, no encontro amoroso com o outro e um profundo respeito a tudo que existe - à vida.
A Educação Biocêntrica tem sua essência primordialmente, em contraposição ao paradigma antropocêntrico sobre o qual estão erigidas as ciências ditas modernas, no paradigma do princípio biocêntrico, que, segundo Toro, “tem como referência imediata a vida, e se inspira nas leis universais que conservam os sistemas vivos e que tornam possível sua evolução” (2002: 50).
Rolando Toro considera o princípio biocêntrico um ponto de partida para um novo olhar ao mundo, estabelecendo-se como estruturante das novas ciências do futuro, marcando dessa forma, uma profunda e complexa mudança de visão de mundo – a vivência de uma mudança de época como explicitado em capítulo anterior deste trabalho.
A importância do princípio biocêntrico enquanto paradigma dá-se na concorrência para uma mudança estrutural do nosso modo de viver, uma vez que proporciona uma mudança existencial de sentir-se e de estar no mundo aqui-agora e não puramente da visão intelectual de mundo, do ponto de vista da racionalidade. A subjetividade ganha importância e alia-se à objetividade, trazendo à luz o ser humano inteiro enquanto singularidade inserida na teia da vida, cultivando as energias potencializadoras, organizadoras, conservadoras e dinamizadoras da vida.
Esse novo jeito de viver a vida proporciona no ser humano mudanças radicais, uma vez que percebe o universo como um sistema vivo, composto de uma rede de sistemas vivos diversos intra e interconectados, compreendendo tudo que existe, conforme explicitado por Toro:
O reino da vida abrange muito mais que os vegetais, os animais e o homem. Tudo que existe, dos neutrinos ao quasar, da pedra ao pensamento mais sutil, faz parte deste sistema vivo prodigioso. Segundo o princípio biocêntrico, o universo existe porque existe a vida, e não o contrário (2002: 51).
A partir desta visão, a pessoa buscará cuidar de si, do outro e do meio, compreendendo, afinal, que mesmo que o ser humano consiga destruir-se a si enquanto espécie, a vida continuará.
Portanto, sob esse enfoque, as organizações devem ser percebidas como complexos sistemas vivos. A vida das pessoas e a vida da organização são igualmente privilegiadas, compreendendo-se ser esta um todo que se expressa a partir da existência de uma unidade complexa de diversidades/singularidades – as pessoas.
Uma organização comprometida com a vida valoriza as pessoas como seres autônomos, criativos, singulares, pois que são diversas entre si. Incentiva a saúde individual e do grupo, a melhoria e o fortalecimento dos vínculos entre as pessoas e destas com a organização como um todo e vice-versa.
A instituição/empresa biocêntrica conta com líderes orientados por valores humanos e de vida, de modo a dinamizar as potencialidades saudáveis de cada um. Assim, são privilegiados a vitalidade, autonomia, desejo de realização, criatividade, fortalecimento de vínculos afetivos saudáveis, vida interior construtiva e libertadora.
3.3.2. Princípio da progressividade
A progressividade consiste no respeito ao movimento interior de cada pessoa. É um dos mais importantes princípios preconizados pela Educação Biocêntrica, pois revela o cuidado consigo e com o outro, tão importante para o fortalecimento dos vínculos internos relacionais (não hierarquizados) com o meio: educante-educando, educando-educandos, educando-meio social.
Este princípio revela-se em cuidado necessário com o ritmo interno da própria pessoa, de modo a possibilitar a corporeificação progressiva, de novos valores, conceitos e teorias, conforme seus próprios avanços. Dessa forma, com o cuidado amoroso, o aprendizado se dá de forma progressiva a qual avança conforme vão se ampliando os limites do educando, promovendo um aprendizado, de fato, assimilado, no sentido de corporeificado em todas as dimensões da pessoa.
Segundo Almeida (Apud Góis, 2002: 69), a vivência se dá de duas formas:- vivência epistemológica – possibilidade de a vivência levar ao conhecimento ou fazer-se conhecer, denotando redução;- vivência ontológica, totalizadora, que trata da vivência mesma do Ser.
Almeida assim define vivência:
A vivência é. A vivência tem sentido, a vivência não separa minha alma da alma cósmica, como fazia o paradigma cosmocêntrico; a vivência não afasta meu corpo do meu espírito como fazia o paradigma teocêntrico; a vivência não hierarquiza a criação, não me torna dicotômico, como faz o paradigma antropocêntrico. A vivência me funde com a Vida, me faz Biocêntrico. (...) A vivência é Ser. Afirmar o SER é ontológico, porém ontologia da vivência: simplesmente afirmando que o SER, que é auto-evidente, tem sentido em si mesmo, o ser estrutura estruturante: Bios (Almeida apud Góis, 2002: 70 e Andrade, 2003: 33).
Na visão ontológica e biocêntrica de Góis (2002: 69), a vivência é "viver o estar-aqui, do instante, do corporal e do estético, da identidade que expressa a vida em sua singularidade, imediaticidade e beleza". É a presentificação do viver cada instante de forma intensa, inteira.
A dinâmica do processo ensino-aprendizagem que busca fornecer meios legítimos, tanto para o educando quanto para o educador, enquanto integrantes de um mesmo sistema proposto pela Educação Biocêntrica, parte também da vivência como vínculo impulsionador das estruturas cognitivas que levam à conscientização com enfoque na construção do conhecimento crítico – a tomada de consciência –; nos instintospotenciais genéticos[1], fortalecendo a função de conexão com a vida. como anteriormente explanado; e, na expressão dos
Através de vivências de amor, harmonia e prazer de viver, busca-se proporcionar uma aprendizagem legítima consolidando, não de modo estático, mas essencialmente dinâmico e processual, o conhecimento construído, a partir de elementos cognitivos e vivenciais. A vivência não está subordinada à consciência, porém esta se encontra enraizada na própria vivência. (Góis, 2002).
3.3.4. Princípio da auto-regulação
A auto-regulação é um princípio latente em todos os seres vivos. Ela possibilita a perfeição dos sistemas homeostáticos dos seres vivos, estando intimamente relacionada ao equilíbrio interno, de altíssimo grau de precisão, direcionado para a conservação da unidade orgânica.
Nos grupos, a auto-regulação pautada no conhecimento de si mesmo e de seus limites leva ao respeito a si mesmo enquanto singularidade.
3.3.5. Princípio da transmutação de valores
A ressignificação do modo de perceber o mundo e de nele atuar pode acontecer com a transmutação de valores que pode ser desenvolvida por meio de vivências de transcendência, do diálogo e do encontro com o outro.
3.3.6. Princípio da dinamização do saudável
Atuar na parte sã da pessoa e de situações, potencializando nelas o que há de saudável e de vida, é um dos princípios mais importantes da Educação Biocêntrica. Sai o foco no que está doente ou errado, para o que tem possibilidade de ser dinamizado para a saúde do ser, ou ainda, para soluções saudáveis de situações críticas.
3.3.7. Princípio da transvaloração cultural
Também chamada de transmutação de valores ou reculturação, a transvaloração cultural permite um novo olhar sobre a cultura, por meio do repensar os interesses variados que permeiam as ideologias existentes erigidas, no decorrer da história.
Promove-se, então, a ampliação dos conhecimentos culturais induzindo o respeito à diversidade cultural, à diferença. São propostas novas perspectivas culturais, sociais e históricas, a partir da percepção de si mesmo como sujeito que participa ativamente da construção social da história e da cultura aqui-agora, consciente dos contextos ideológicos. (Cavalcante, 2001).
É por meio da problematização da realidade contextualizada, da abertura a novos valores, conceitos e teorias que se pode transvalorar a cultura, saindo do enrijecimento, da fossilização que adoece e mata, para a flexibilização, a criatividade, a inovação, a mudança sempre saudavelmente agregadora da realidade entendida como processo em prol da vida.
3.3.8. Princípio da reciprocidade
A partir do princípio da reciprocidade, estimula-se o encontro dialógico, tanto no plano corporal como no verbal, que resulta no crescimento humano existencial e teórico, por todo o seu tempo de existência, respeitando-se os limites de cada pessoa. O diálogo com cada pessoa do grupo é um importante meio para que o relacionamento intra-grupal seja saudável.
3.3.9. Outros princípios importantes
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[1] Toro (2002) defende a importância de se estimular o desenvolvimento genético durante toda a curva da existência da pessoa, pois para o mesmo “a totalidade do nosso potencial genético é contida em cada uma de nossas células; a natureza, para preservar a informação, a reproduz milhões de vezes. Certos genes permitem, ou impedem, a expressão de determinadas características. Assim, por exemplo, a inteligência, o tom de voz, a sensibilidade cenestésica, dependem da ação conjunta de genes diversos. No processo de expressão genética, algumas potencialidades permanecem em silêncio, pois não encontram os eco-fatores específicos necessários para que elas se manifestem. Ademais, as potencialidades genéticas podem ser consideradas como elementos altamente determinados que são dotados de uma grande estabilidade, cuja expressão dependerá das condições oferecidas seja pelo ambiente externo, seja pelo próprio organismo".
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