sábado, 18 de agosto de 2007

Opção Terra

Leonardo Boff*

A marca registrada da Igreja da libertação com sua correspondente reflexão reside na opção preferencial pelos pobres, contra a pobreza e em favor da vida. Nos últimos anos começou-se a perceber que a mesma lógica que explora as pessoas, outros paises e a natureza, explora também a Terra como um todo, em vista do consumo e da acumulação em nivel planetário. Dai a urgência de se inserir na opção pelos pobres o grande pobre que é a Terra. A opção hoje não é tanto pelo desenvolvimento, ainda que sustentável, nem pelos ecocossistemas em si mas pela Terra. Ela é a condição prévia para qualquer outra realidade. Ela tem que ser preservada. [O autor define ecologia em 4 vertentes: ambiental, social, mental e integral].

O relatório do Painel Intergovernamental das Mudanças Climáticas (IPCC) que envoveu 2500 cientistas de 130 paises, revelou dois dados estarredores: primeiro: o aquecimento global é irreversível e já estamos dentro dele; a Terra busca um novo equilíbrio; segundo, o aquecimento é um fenômeno natural mas que após a revolução industrial foi enormemente acelerado pelas atividades humanas a ponto de a Terra não conseguir mais autoregular-se a si mesma.

Segundo James Lovelock, em A vingança de Gaia (2007) anualmente se jogam na atmosfera cerca de 27 bilhões de toneladas de dióxido de carbono, que condensadas, equivaleriam a uma montanha de um 1,5 quilômetros de altura com uma base de 19 quilômetros de extensão. É o efeito estufa que pode elevar a temperatura global, consoante o Painel, ainda neste século, entre 1,8 a 6,4 graus Celsius. Com as medidas que possivelmente serão tomadas, a elevação de 3 graus é tida como a mais provável mas inevitável. As consequências serão incontroláveis, os oceanos subirão entre 18 a 59 cm, inundando cidades litorâneas como o Rio de Janeiro, haverá devastação fantástica da biodiversidade e milhões de pessoas correm risco de desaparecer.

Jacques Chirac, presidente da França, face a tais dados, disse com acerto: "chegou a hora de uma revolução no verdadeiro sentido da palavra: uma revolução das consciências, da economia e da ação política". Efetivamente, como não podemos parar a roda do aquecimento, podemos, pelo menos, desacerelá-la mediante duas estratégias básicas: adaptar-se às mudanças; quem não se adapta, corre risco de morrer; minorar as consequências deletérias permitindo sobrevida à Gaia, aos organismos vivos, especialmente, aos humanos.

Aos três famosos rs: reduzir , reutilizar e reciclar , há de se acrescentar um quarto: rearborizar todo o planeta, porquanto são as plantas que capturam o dióaxido de carbono e reduzem consideralvemente o aquecimento global.

Esse quarto r é fundamental para a preservação da Amazônia. Suas florestas úmidas são as grande reguladoras do clima terrestre. O desafio é como combinar desenvolvimento com a manutenção da floresta em pé. Não podemos desmatar no nivel que se estava fazendo. Mas nem de longe somos os campeões do desmatamento, como revelou recentemente E.E.Moraes em seu livro Quando o Amazonas corria para o Pacífico (2007). A África mantém só 7,8% de sua cobertura florestal, a Ásia, 5,6%, a América Central 9,7% e a Europa que mais nos acusa apenas 0,3%. O Brasil conserva ainda 69,4% de suas florestas primitivas e 80% da floresta amazônica.

Isso não desculpa nossos níveis de desmatamento nem é motivo de orgulho mas representa um desafo à nossa responsabilidade global para o bem do clima de todo o Planeta.

* Leonardo Boff nasceu em Concórdia, Santa Catarina, aos 14 de dezembro de 1938. É neto de imigrantes italianos da região do Veneto, vindos para o Rio Grande do Sul no final do século XIX.Fez seus estudos primários e secundários em Concórdia-SC, Rio Negro-PR e Agudos-SP. Cursou Filosofia em Curitiba-PR e Teologia em Petrópolis-RJ. Doutorou-se em Teologia e Filosofia na Universidade de Munique-Alemanha, em 1970. Ingressou na Ordem dos Frades Menores, franciscanos, em 1959.

Fonte: JB, 2/3/2007.

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